Olá, meu nome é João e… eu sou viciado em café.
(Coro de vozes: “Olá, João!”)
Eu sei que estou aqui para superar isso, mas, sinceramente, só o fato de estar sem um café na mão já está me deixando ansioso. Vocês têm certeza que essa reunião precisava ser sem cafeína? Digo, não poderíamos ao menos ter um descafeinado? Só pela sensação psicológica? Não? Ok…
(Ao fundo, alguém murmura: “Isso aqui é um absurdo…”)
Bom, minha história com o café começou cedo. Enquanto outras crianças tomavam achocolatado, eu já pedia um café com leite. Aos 15, larguei o leite. Aos 20, descobri o expresso. Aos 25, entendi que um expresso duplo às 22h não era uma boa ideia (mas continuei fazendo). Aos 30, tive um momento de epifania: percebi que minha carteira de identidade deveria, na verdade, dizer “Tipo sanguíneo: café puro”.
(Aplausos solidários.)
Mas eu não estou sozinho. Vejam o Carlos ali. O homem já tentou substituir o café por chá uma vez. Durou três horas e meia. Ele foi visto tremendo de abstinência na frente de uma cafeteria, olhando para dentro como uma criança na vitrine de uma loja de brinquedos.
Carlos: “Eu juro que tentei… Mas o chá não me olha do mesmo jeito que o café olha. O café me entende!”
(Todos balançam a cabeça em concordância.)
E a Mariana? Ela tentou aquela técnica de “reduzir gradualmente”. Disse que trocaria o café da tarde por um suco. No segundo dia, foi flagrada no trabalho farejando a xícara de um colega. No terceiro, foi encontrada segurando uma cápsula de café como se fosse uma joia rara. No quarto dia? Bem, ninguém a viu mais sem uma caneca na mão.
Mariana: “A vida sem café é uma existência sem propósito.”
(Um silêncio respeitoso toma conta da sala.)
E, então, há o Paulo. O caso mais grave de todos. Ele não apenas bebe café, ele estudou barismo. Aprendeu a fazer latte art e agora desenha corações no próprio café só para se sentir amado.
Paulo: “Meu cappuccino me dá mais carinho do que qualquer relacionamento que já tive.”
Todos: “A gente entende, Paulo…”
E há também a Vanessa, que jurou que não era viciada até o dia em que seu marido escondeu a cafeteira para fazer um experimento social. Resultado: seu humor ficou tão instavel, que seu marido foi dormir no sofá por uma semana (até que o homem aguentou bastante), e antes que ele acabasse com essa brincadeira sem graça, Vanessa comprou uma cafeteira nova e a deixa escondida dentro do seu lado do guarda roupas.
Vanessa: “Eu realmente estava calma, controlada nos primeiros dias, meu ele disse que tinha levado a cafeteira para arrumar, até que percebi que tinha algo errado no fato da cafeteira que nao retornava, comprei outra e antes que ela chegasse me peguei usando sachês de café instantâneo como se fossem drogas. Uma cheiradinha aqui, uma lambidinha ali… quando percebi, estava dissolvendo o pó direto na boca.”
(Expressões de horror na sala.)
A história mais emocionante, no entanto, é a do Roberto. Ele tentou largar o café radicalmente. Resistiu por 48 horas inteiras. No terceiro dia, foi encontrado debruçado sobre uma mesa de escritório, quase catatônico, encarando um grão de café como se fosse um diamante.
Roberto: “Eu falhei. Falhei feio. Eu ia conseguir. Mas vocês não entendem… o café sussurrou para mim. Ele disse que me perdoava e que me aceitaria de volta.”
Todos: “É claro que ele perdoou, Roberto. O café sempre perdoa.”
A verdade é que estamos aqui porque a sociedade insiste que “não é normal precisar de sete doses de café para existir”. Mas quem somos nós sem o café? Pessoas normais? Produtivas antes das 10h da manhã? Isso soa horrível.
Então, talvez, esta reunião não seja sobre superação. Talvez seja sobre aceitação. Aceitar que nunca seremos aqueles que começam o dia felizes sem antes sentir o aroma de uma xícara quente. Que jamais entenderemos aqueles que dizem “não sou muito fã de café”. Que, se um dia tivermos que escolher entre café e qualquer outra coisa… bom, já sabemos a resposta.
João: “Eu sinceramente não sei se é uma boa idéia eu estar aqui, me sinto tremulo e com tonturas.”
(os integrantes da roda lançam olhares solidários para João”
Roberto: “Parceiro, fique tranquilo, vai passar, fiquei assim tambem, é horrivel essa abstinencia, me deu até dor de cabeça, fiquei agitado quanto tentei.”
Alguem na roda: “E ainda dizem que é o café que dá esses sintomas, ridículo.”
Profissional conduzindo a reunião: “Pessoal, acalmem-se, todos estão aqui para se verem livres do vício do café, vamos respeitar a fala um do outro e aproveitar esse momento para nosso brado, repitam todos: ‘Só por hoje’.
Todos: “Só por hoje.”
João: “Pessoal, obrigado pela paciência nesse meu primeiro dia. Agora, pelo amor de Deus, alguém tem um café aí????”